sábado, novembro 04, 2006

As Letras e o Tango

A palavra se contorse em formas e, de forma em forma, forma um homem. Um homem feito de letras. Lê, desviando de acentos e hífens, para a mulher, de carne e osso, a suas frente, reparando em vírgulas. É sensual, seduro, porém, há uma doçura que faz de todo o conjunto algo muito mais atraente.
A mulher veste-se para agir: Está vestida para o tango.
O tango toca no fundo. Dança sozinho a sua própria melodia.
O homem lê embriagado para a mulher. Conforme mudam seus sentimentos, mundam suas letras. Lia-se a pouco 'desejo', em seu corpo de letras; depois de um instante de letras embaralhadas tornou-se 'decisão'; mais letras embaralhadas e, quando se formava em seu corpo a palavra 'coragem', levantou-se e foi em direção a ela.
Tango.
Tango.
Tango.
Ia chegando perto e, quanto mais perto chegava, mais suas letras se embaralhavam. Lia-se nele, por mais que o tentasse esconder, 'nervosismo'. Até que, enfim, parou frente a frente com ela: Letras nas letras; olhos nos olhos; olhos nas letras.
Experienciou um momento de nada. Sua excitação era tanta que esvaziou-se. Não falou nada, somente letrou-a e ela o olhou em resposta. Ele estendeu mão, ela desviou o olhar, ele sorriu, ela deu-lhe a mão. O tango falou e ela leu-o: Satisfação.
O ritmo do tango incendeia-se e
tango
e tango
e tango
e tan
Na parada marcada do tango apertou-a contro o seu corpo tornando mais firme a pressão que fazia com seu braço de letras em torno daquela cintura. Agora todo ele era paixão em letras maiúsculas...
e tan
tan
tan
tan
tan
Os dançarinos incendiavam-se. Trocavam eletricidade pura entre letras e carne.
E tan!
Ele a curva. Seus braços rijos seguram o peso enquanto as pernas rijas da mulher se dividem entre apoiar-se no chão e flutuar na música.
No silêncio da música, a rosa que ele segurava em suas letras cai e ele, a mulher e o tango se dissipam em extase....
e tan
e tan
e tan
e tango!

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