terça-feira, agosto 25, 2009

Hoje é Quarta-Feira

Hoje é quarta-feira de acalmar os ânimos, um dia antes de quinta-feira de pensar e de sentir. E, só hoje as coisas começam a se assentar.

Talvez tu não saiba, mas essa semana nós brigamos muito. Ou melhor, eu briguei muito contigo. Até ontem "nós" estavamos de mal. Mas hoje algo acordou diferente em mim.

Ontem passei o dia fazendo tabelas, calculando quantas horas trabalhei no mês . Hoje consegui cobrar umas horas que faltavam do meu chefe, tudo muito tranquilo, muito feliz. E me senti diferente em relação a ti. Como diria o meu repudiado ex-chefe Pablo, "quem organiza por fora, organiza por dentro" e acho que ontem acabei, sem querer, organizando algumas coisas por dentro também.

Na última sexta-feira, 3 gatos cruzaram o meu caminho. E dois eram pretos. Não sei se foi prenúncio de azar ou, como são as cartas, somente uma reafirmação do meu estado de espírito. Sei que a semana foi turbulenta e, não tenho nenhum problema em dizer, foi turbulenta ainda por causa da quinta-feira.

Nossa, como foi um churrasco pesado aquela quinta, demorei muito pra digerir. De noite eu ainda esta brava, triste, chateada. Escrevi. Passaram-se os dias e continuei confusa, em dúvida, sem saber o que pensar, o que sentir ou como agir na próxima quinta-feira.

Foram dias onde muitas coisas se definiram e eu me dividi entre a vontade e o medo de te contar. A insegurança de quem não faz a menor idéia de como agir. Eu esperava reagir de alguma maneira, mas como tu sempre, bastante deliberadamente, me força (ou dirige) a agir, enfrentar o início constrangedor de cada inicio de sessão, passei muito tempo tentando achar uma resposta para como agir hoje. Foi muito confuso. Mas hoje me sinto estranhamente diferente. Sinto uma certa paz e volto a sentir somente a vontade de dividir as coisas contigo. Vontade sem medo.

Enquanto eu dirigia entre uma aula e outra hoje, investi meu tempo tentando entender porque chorei tanto. O que me abalou tanto nessas últimas semanas. Na verdade nem pensei muito, uma conclusão me veio meio derrepente (já na nova ortografia): Era o medo de ficar sem chão.

Tanto falamos em cair, o medo de cair, do DNA constante. Falamos muito em cair, mas pouco em chão e eu acho, Júlio, que esse é meu medo, perder o chão. Cair e continuar caindo e não ter quem, ou o que, me segurar.

Falamos muito em "por quê será?" na sessão passada. Tu indagativo. eu irônica. Mas agora me encontro sugestiva, aberta e proponho uma hipótese: Porque sempre achar que sempre vão me pedir DNA?

Será que não é por medo de não ter DNA. Talvez seja, talvez meu medo seja esse. Quem é o meu pai? Em ambos os sentidos: Se meu pai não for meu pai, então quem é? E meu pai sendo meu pai, quem ele é? Para ambas as perguntas: não sei.

Mas de uma coisa eu sei: eu chorei na sessão (escrevi aula antes, que ato falho) passada, foi de medo de perder o chão. Medo de perder o DNA da relação que construímos. Medo de perder o Júlio.

E daí talvez fique mais fácil tu não ficar tão brabo. E se a gente tentar entender não como "quero mais, quero mais, quero mais" e sim como "preciso muito, preciso muito", o que será que muda? Na sessão passada chorei por uma possibilidade de perda e acredito que seja essa possibilidade que me move tanto.

No meio de tudo isso, uma coisa fica clara: temos aqui um sentimento, Júlio. Acho que vemos o exemplo mais forte do quanto tu te tornou importante e, se um dia tu te dispôs a quebrar os pratos e desistir de uma paciente que "não confiava" em ti, passados alguns meses, vemos uma gigante diferença. E esse foi o choro. O choro de quem nutre algo e que tem medo de perder, muito. Agora só falta ajustar o sentimento a hora e o local exatos, colocar a flor dentro da cúpula.

E falando em Pequeno Príncipe, me ocorre o pensamento de que agora tu também está envolvido. Terapia é um "jogo" que parece unilateral. Alguém só um se apresenta vulnerável. Mas talvez não, agora eu percebo, ou talvez sinta que "tu te torna eternamente responsável por aquilo que cativas". E, sendo assim, tu também não está imune. Já que cativaste, Júlio, com o perdão do trocadilho, agora toma, que o filho é teu.

DNA.

quinta-feira, agosto 20, 2009

Eu queria sentir só nas quintas-feiras.

Talvez a vida fosse bem mais fácil com horário marcado. Talvez fosse bem mais enfartante também, com todos os sentimentos e pensamentos reservados para os 45 minutos das 14:00 as 14:45.

Mas infelizmente eu penso e sinto mais do que somente as quintas-feiras. Penso (quase) todos os dias e sinto diáriamente, as vez mais de uma vez por dia, entre e inclusive durante as refeições. Eu sinto em horários esdrúxulos e sem hora marcada, e insisto em sentir mais durante as madrugadas. Eu sinto sem lógica marcada também, e quando sinto que sinto, dou graças a Deus e me permito sentir, qualquer coisa que seja.

Eu me atraso sempre e quando eu não quero estar em algum lugar, e demorei 22 pra descobrir isso. Eu quero mais, eu sempre quero mais, e não demorei 22 anos pra descobrir isso, sei que sei disso mais ou menos desde os 15 anos, quando nada me era completo. Mas demorei 22 anos pra descobrir que me sinto julgada quando tu fala sobre voracidade, direto e seco, daí da cadeira do doutor. Ainda não consegui muito bem fazer a diferença entre voracidade e ambição. Existem pessoas que são ambiciosas e não são vorazes? E pessoas que são vorazes e não ambiciosas? Eu não sei. Eu até hoje não sei se sou ou não ambiciosa... E mais importante de tudo, ainda não me decidi se isso é bom ou ruim. Só não quero ser julgada antes de decidir qual é o meu julgamento. Isso já traz outra discussão, mas essa fica para uma próxima quinta-feira.

Mas fato é, daí, da cadeira do doutor, às vezes vem lógica inegável. Lógica tão lógica que as vezes chega a ser chata e ferir o meu pequeno besta orgulho. Mas inegável lógica. Só que às vezes vem julgamento. Às vezes vem valor tão cheio de juízo que me dói, muito. É quando mais me dói a cadeira do paciente. O paciente deveria ter paciência, não? Ou seria o doutor que tem que ter paciência? Português é uma língua confusa.

Confusão. "Tu gosta da confusão porque tu sente que tem uma vantagem". NAO! Aí como isso me dói. Como isso me doeu na quinta-feira em que eu tinha que sentir e ao mesmo tempo te deixei puto da cara porque não estava "sentido do jeito certo". Porra, eu tava só chorando. Vamos tirar o juízo de valor por um momento? Eu não fico acéfala quando choro. E gostaria muito que as pessoas ao meu redor não perdessem a sensibilidade quando pensam. E isso inclui a ti. Ok. I get it. É o choque do paciente, é o grito do diretor ditando o clima do set. I get it. É o teu jeito. Ficar puto com ladaínha, acho até que vez por outra tu grita pra conter a vontade de virar as costas e bater a porta. Ai como gente é um bixo chato, tu pensa. E lá se foi a paciência do doutor.... Talvez eu seja de fato bem confusa. Talvez eu faça graça com isso. Talvez um monte de coisas. Mas dizer que eu gosto, que me sinto em vantagem? Não sei não, Júlio. A antítese eu já concordei. Já entrei em paz com o gostar dos extremos e bla bla bla. Mas essa da confusão acho que vem mudando. Eu gosto muito de pão, pão; queijo, queijo. Gosto que as coisas sejam tão distintas a ponto de se fazer sanduíche.

Ter as coisas claras foi o que me levou a, no blog, fazer um post sobre assuntos do blog. Fazer um comentário secreto pedindo ajuda. E fazer outro comentário falando do tema, da política do mundo. Era sobre isso mesmo que se falava ali: confusão. Aquele era um post. Uma opinião. Uma participação clara. Cada um no seu quadrado. Para mim, um diálogo. Não vi confusão ali. Nem monólogo. Talvez tu tenha visto mais do que eu. Eu me preocupei ali em dialogar com o que tu dizia, com o que a outra criatura dizia e ainda com o que eu dizia, no caso do post político e este não ter sido publicado, sim, me causou confusão. Foi pra mim uma mensagem clara e direta de: "área restrita para pessoal autorizado". Difícil restringir uma área em um espaço público. Difícil ter uma vida pública privada sem ter a vida privada pública. Não, Júlio? No caso do de ajuda foi diferente, a minha tentativa foi estabelecer um diálogo, dizendo : oi! preciso de ajuda! me ajuda? Inclusive pedindo uma consulta extra para falar no consultório sobre coisas do consultório. Foi mesmo tão confuso? Foi mesmo tão solitário. Da minha parte não.

Infelizmente, foram sentimentos que não vieram na quinta-feira.

Já os que vieram na quinta-feira seguinte, esses sim, foram confusão pura. "É o que acontece no processo criativo" tu diz. É a prática posta a prova que não funciona. Great. Acho lindo. Beleza. Mas será que alguém podia me avisar antes? Pra mim o que aconteceu foi contradição. E me desculpa por pensar que poderia ter afetado o inafetável Julio, me desculpa por ousar pensar que tu poderia entrar em uma defensiva qualquer. Talvez defensiva tenha sido a palavra errada. Mas que tu foi mais ríspido, foi. Que tu foi mais duro, foi. E que eu sai de lá me sentindo acusada de crime inafinaçável por talvez sentir por alguém um carinho paterno, sim, eu saí.

E aí eu me sinto a coitadinha por ter feito tuuuuuuudo certo e bla bla bla. Que diabos de certo ou errado está acontecendo? Tu, quando não entende, fica horas olhando pras coisas. Eu, choro. Adoraria ser o cérebro racional e inabalável e ainda assim ser artista sensível e ator mestre marionete dos meus próprios sentimentos. Talvez se eu fosse assim meu nome fosse Júlio César cheio de acentos e eu fosse imperador de Roma. Eu não alcanço a tua racionalidade Júlio, não consigo, tenho as pernas curtas eu quando não estou a uma determinada distância, não consigo nem ver a tua reação na porta do consultório sem olhar pra cima. Foi o que aconteceu na última quinta-feira. Distância de menos, gap demais entre o teu pensar e o meu sentir. Acabei olhando pra baixo, agora só consigo imaginar possíveis reações tuas.

Isso foi um desabafo, mais do que qualquer outra coisa. Não quero ofender, acertar, ganhar perder, certo errado. Nada disso. Vim tentar escrever pra ver se acendia a luz. Acabei escrevendo pra alguém, ainda tenho uma semana pra decidir se te entrego ou não. Essa é uma das vantagens de só se pensar nas quintas-feiras....

De uma maneira ou de outra, acho até poético tudo isso. Um caminho bem torto pra se chegar a um possível resultado incrível, já que estamos tendo a oportunidade de estudar os meus "problemas de relacionamento" de dentro de um relacionamento, de determinado tipo, com e sem problemas. É como a neurocientista que teve um derrame e fez um livro de neurociência analizando um derrame "de dentro".

O personagem acabe de ler. Coloca o papel sobre a mesa. A sessão acaba. A Paciente sai da sala.

FIM

O final perfeito de uma ficção sem confronto. Certamente não vai ser assim. Agora é a hora eu que eu respiro fundo e me preparo pra mais um choque de realidade vindo da cadeira em frente.