sexta-feira, outubro 23, 2009

Hoje



Ainda é hoje
Passou-se mais de mil anos
E ainda é hoje

Nero queimou Roma
Ainda hoje mais cedo
E ainda é hoje

Meu coração ardeu em chamas
Explodiu em amores e dúvidas
E ainda é hoje

Ainda hoje uma estrela explodiu
e
Ainda hoje
Outra estrela nasceu
E ainda é hoje

O mundo viu a guerra acabar
E no meu coração de Hirishima
Uma rosa se abriu
E ainda é hoje

Ainda hoje eu andava na rua
Estranha
E ainda hoje
No palco
As cortinas se abriram

Ainda hoje o trabalho acabou
Ainda hoje pintei minhas unhas
Ainda hoje jantei com amigos
E ainda é hoje

Ainda hoje não consigo dormir
E ainda hoje nasceu um poema

Pobre amanhã
Que tarda em chegar
Já virá ao mundo ocupado em vencer
Porque ainda hoje
Passaram-se mais de mil anos
E ainda é hoje

Diálogos Íntimos





Em uma madrugada de Quarta-feira qualquer...

Ele diz:

- Vou parar de falar. Cansei de falar de mim, sempre sou só eu que fico horas falando de mim.

Ela responde:

- Isso não é verdade, eu estou sempre falando.

Ele, rápido, argumenta:

 - Tu está sempre falando, mas só tu fala sobre aleatoriedades. Todo o tipo de aleatoriedades. Tu fala sobre...  os abajures da Europa....

***
E encerra o assunto:

- Tu não fala sobre ti, é preciso saber te ler.

***

Como falam as madrugadas.

Bolsa de Mulher



Em uma transição bem sucedida da adolescencia para a idade adulta, 3 coisas aumentam, junto com os anos, em uma bolsa de mulher:

A carteira
A frasqueira de remédios
e a necessaire de maquiagem.

E isso diz muito sobre meninas e mulheres.
***
Ah... os 30 que me aguardem...

segunda-feira, outubro 19, 2009

Poema a Pequenas Mortes




É  tanta vida
É tanto sonho
Que me explode o peito
E a vontade que dá
É de virar letra
Errada e errante
E viver de pequenas mortes
Em livros de poesia.


Um amigo em um bar me disse:
Sabes como é orgasmo em fracês?
Petite-Mort.
E o que é a vida

Se não viver de pequenas mortes?



Já dizia o poeta
"Todos os poemas são o mesmo poema.
Todos os tragos são o mesmo trago.
Não é de uma vez que se morre..."


E não é.
Se morre a cada instante
E, a cada instante
Se explode novamente em vida.
Como fênix incandescente
A vida é o exercício do acender de flamas
E do apagar
De chamas.
E viver como letra errante
Morrendo a cada instante
Num virar de páginas.


Um pequeno morrer a cada estante.
Um grande viver
A cada nova sílaba entrante.
O prazer constante do afogar-se
E pela força soberana da onda,
Tragar-se.


Já que todos os poemas são o mesmo poema
E todos os tragos são o mesmo trago
Graças aos deuses!
Não é de uma vez que se morre.
"Todas as horas são horas extremas"





(Une petite mort pour vous tous les jours, Outubro, 19, dois mil e nove)




sábado, outubro 17, 2009

Sobre Tequilas, Mortes e Vidas

Apaixonar-se é como tomar um grande trago...

 

A paixão é como um shot de tequila duplo: acelerante, extasiante e que faz com que se suba em cima da mesa e se cometa todo o tipo de besteiras.

Já a vida é como um dia, uma terça-feira qualquer. Cheia, Completa metas, objetivos e compromissos. Um dia de semana daqueles em que se faz de tudo, trabalho, academia, textos, telefones, alunos, demandas, problemas, soluções. Para só depois, no final do dia, ou no final de uma semana com vários destes dias, dar-se ao luxo de poder cometer shots de tequila.

Mas pra mim ainda é terça-feira e, aos 22 anos de uma terça-feira de um sábado qualquer de Outubro, ainda são 9 da manhã. E por que alguém cometeria um trago logo agora, com um dia inteiro pela frente?

Ainda falta para ser o hora certa para um duplo de tequila e, por enquanto, minha mais prazeirosa loucura é a sobriedade em um bom copo de refrigerante.

Ainda falta para que eu possa cometer excessos de diversas ordens, mas agora vivo o prazer do limite: uma vida de poucas gorduras, poucas folgas e um controle rigoroso da paixão.

Transmimentos de Pensações - Uma Amiga me Salvou








A sensação que tenho é que me perdi de mim. 






Uma coisa incômoda sobe do fundo da mente e me gera um mau humor gigantesco.
Acho que as conversas foram muito fortes. Muita energia passando, meu primeiro instinto é fugir.

Pela primeira vez, talvez, fugir de tudo que não sou eu. Antes a busca era fugir de mim, fugir pra fora, em outros mundos, me esconder em outras vidas. Agora não. De jeito nenhum! Só a possibilidade me arrepia - Perdi a palavra. Possibilidade do que? Não sei. Eu tinha uma expressão perfeita, mas, também ela, fugiu.

Não quero abdicar de ter minha vida inteiro. Minha mãe está certa. Sentada aqui do meu lado no sofá, ainda chateada comigo, nem desconfia do quanto lhe dou razão. Não importa o quanto não soe romântico, o quanto seja egocêntrico: não estou disposta a me dividir. Não agora. Conheço bem a história, é sempre assim, é bom, é viciante, é aprazível e, quando nos damos por conta, já trocou-se o papel de estrela da peça por um de coadjuvante de um roteiro pobre em cartaz num teatro de segunda.

É isso que são relações: ladrões de elenco. Nos tiram do nosso próprio centro, nos interropem monólogo que só nós podemos dizer e nos sugam para um roteiro sem trama onde acabamos por nos tornar coadjuvantes de nós mesmos. .......

O telefone tocou!

Ufa, uma amiga me salvou pra mim. A mágica das relações.

A mágica do mundo.

A nossa mágica.

A minha mágica.

A mágica.
A µágica.

µágica.

sexta-feira, outubro 16, 2009

Pneumotórax HiperEMOTIVO





Mais um texto que começo fazendo uso da lígua do "uma vez".






Uma vez eu era mergulhadora e aprendi sobre Pneumotórax Hipertensivo. Basicamente é o nome do ao diagnóstico médico dado para uma super-expansão de oxigênio dentro dos pulmões, que pode levar a uma série de complicações como super oxigenção do sangue, erupções cutaneas e, até mesmo, ao rompimento dos pulmões. Eu jamais entederia sobre Pneumotórax Hipertensivo não fosse pelo curso obrigatório para obtensão da licença de mergulhador amador que fiz em idos de mil novecentos e muito tempo atrás.No mergulho, Pneumotórax Hipertensivo é uma coisa séria e até comum, uma vez que, tendo trocado as guelras por orelhas a algum tempo atrás na escalada evolutiva nós, homens, precisamos fazer uso de cilíndros de ar comprimido para respirarmos embaixo das altas pressões aquáticas.

Tentando fugir de termos muito técnicos, de forma simplificada, é mais ou menos assim que  acontece: ao nível do mar, vivemos no que foi denominado1 ATM, é a medida de pressão atmosférica que consideramos "normal" para os seres humanos;  quanto mais fundo se vai em direção ao centro da Terra, mais o "peso" da atmosféra faz pressão sobre nossas cabeças, aumentando, assim, a pressão atmosférica. Por convenção, a cada 10 metros abaixo do nível do mar temos o acrescimo de 1 ATM, assim, um mergulhador que está a 30 metros de profundidade está sofrendo 3 vezes mais pressão atmosférica do que seu amigo que ficou no barco tomando banho de sol.

E o que isso tem a ver com Pneumotórax Hipertensivo?

Acontece que, se no topo do Everest é difícil respirar porque o ar é rarefeito, no fundo do mar acontece o oposto. Com o aumento da pressão, as particulas de oxigênio se aproximam, comprimindo o ar e fazendo com que ele tenha o mesmo "poder", mas ocupe menos espaço. Sabe amaciante de roupas concentrado? Pois é, estamos falando de ar concentrado. Segue a mesma lógica.

Ocorre que, a 4 ATMs, o ar está ocupando 1/4 do espaço que normalmente ocuparia, mas nossos pulmões continuam cheios, o que significa dizer que temos 4 vezes mais ar dentro deles do que o que caberia em condições normais. O que significa que "Imagina o que acoteceria se passassemos de uma situação de 4 ATM para 1 ATM de uma vez só, sem intervalos de descompressão". O que significa que cheguei onde queria chegar: intervalos de descompressão.

* * *

Uma vez me disseram que uma vez Vinícius de Moraes constumava dizer uma frase. Ele dizia que não gostava de andar de avião porque o corpo chegava muito rápido e não dava tempo da alma acompanhar.

É exatamente assim que me sinto. Um dia de manhã eu fazia uma tatuagem e sentia o cheiro da liberdade em um corredor de hotel e, no mesmo dia a noite, 4 estados mais ao sul, a atmosféra pesava 4 vezes mais em obrigações e responsabilidades.  Minha alma ainda flutua, mas meus pés já estão de novo calçados nos sapatos de chumbo do dia-a-dia.

Todo o tipo de viagem, sendo uma porta para outras realidades, deveria, mandatoriamente, incluir intervalos de descompressão da alma; para evitar quadros como o que me encontro agora: acho que estou sofrente de Pneumotórax Hiperemotivo. 


No Mar de Janeiro

O Rio desaguou estórias

E, em um Outubro de prazeres a gosto

Cada palavra é um ramo

De patas ainda por nascer

E asas ainda por voar.

No Mar de Janeiro:

No Mar de Janeiro:

 - Fecundei Ideias



- Tive conversas de valores impagáveis

 


- Tomei tragos homéricos




- Recebi  elogios desconcertantes

 


 - Conversei com artistas e diplomatas




- Me interessei por  pessoas interessantes




- Vi, vivi e escrevi arte




- Fui descoberta por um tatuador nas primeiras linhas de um diálogo




- Senti o cheio verde e branco do mar




- Vivi o luxo sem pretenção





- Vivi um incrível presente e vi a vida melhor no futuro




- Redescobri o Brasil




- Reencontrei uma irmã





 - Aproximei um pouco mais minhas patas de minhas asas.

segunda-feira, outubro 05, 2009

Filhos da Burguesia - A redenção



Bed of Dreams
Artist: http://www.kathysart.com/Earth_Goddess_Art_Bed_of_Dreams.html


Sempre me senti um pouco perseguida pelo fantasma das boas idéias (minhas ou de outrem) que tornavam-se vapor por falta de investidores. Desejei muito um mundo de Venture Capitalists que se dedicassem a ser mecenas das artes e das pessoas de talento.  Lia livros sobre milionários extravagentes e desejava em segredo conhecer algum que acreditasse nos talentos que conheço e, algumas vezes, nos meus próprios talentos. Mas meus desejos de apadrinhamento, bem como minhas idéias, provaram-se sempre voláteis à economia.

Mas hoje a burguesia se redime. Há alguns dias escrevi um texto reacionário sobre a frivolidade da burguesia aos 16 anos e, no entanto hoje, me encontro contradita. Passa-se que fui hoje a um encontro de sociedade. Para a aniversariante, apenas uma reunião de amigas de longa data; para mim, dentro de um olhar de dentro, uma festa com boa comida, boa champagne, algumas caras conhecidas e muitas caras arrumadas e arrogantes; para mim, dentro de um olhar de fora, um encontro de sociedade, ou, como costumo brincar, um daqueles encontros onde, se se explodísse uma bomba, se mataria metade do PIB do estado em que resido.

Entre elas uma menina loira, bem apessoada, bonita e elegante, de bons traços e modos delicados. Estuda comigo na mesma escola, fomos colegas em algumas cadeiras e tivemos a chance de trocar algumas palavras além de cordiais cumprimeitos. Eu, um pouco bastante deslocada, estava sentada sozinha, aos cuidados de um queijo Brie e uma taça de espumante. Me dei conta então que estava incoscientemente me afastando, sentada com algumas cadeiras de diferença do resto das meninas. Resolvi me enturmar e ocupei um lugar vago no sofá, ao lado da menina loira. Por cordialidade, puxei conversa falando que fazia tempo que não nos víamos e, na falta de qualquer coisa mais interessante para falar, perguntei como estava a vida após a sua última viagem. Tentando recolher dados sobre o que sabia da menina, perguntei como andavam seus projetos artísticos. O que se seguiu daí foi uma conversa extremamente agradável e que me inundou com um quê de esperança.

Ocorre que a menina é de uma das, se não a mais influente, das famílias do meu estado. Vem de "alta estírpe" e foi criadas nos berços mais dourados em que alguém poderia ser. Os melhores colégios, as melhores babás, os melhores cursos, roupas, oportunidades, presentes de natal. Mas é irônica a vida e tem caminhos tortuosos para construir caráter, seja a pessoa nascida em berço de ouro ou em uma mangedoura de palha. No caso desta menina, posso dizer que o que lhe construiu foi a saúde. Nasceu com saúde frágil e um coração que necessitava cuidados, desde muito cedo, frequentou igualmente encontros de sociedade e salas de cirurgia e, destas, resultaram algumas sequelas que ainda guarda.

Mas quis a vida que além de dinheiro e um coração frágil, a menina tivesse, também, uma alma de artista. Desde muito cedo se dedica a pintura e tem pelas artes grande paixão. E agora, aproximado o momento da sua graduação universitária e de uma escolha mais objetiva por um futuro profissinal, a menina loira de modos delicados me confessou honestamente um sonho, aberta como só alguém em uma festa de amigos de infância e bem acompanhada por champagne e Brie poderia estar.

Me confessou ela que, após passar um tempo em uma escola de arte na Inglaterra, a qual ambas conhecemos e "frequentamos", voltou para o Brasil com o sonho de estabelecer moradia aqui, na nossa pequena província e, aqui, criar uma universidade totalmente dedicada as artes. A todos os tipos de arte.

Mais do que isso. Diz que está pensando no projeto a sério, que pretende viajar pela Europa e Estados Unidos buscando desvendar o que há de melhor nas escolhas de arte e, mais ainda, que já discutiu os planos com seu avô, que muito a apoia. Diz ele, ainda, "que investimentos se consegue e que dinheiro se dispõe".

E eu, que sempre me vi perseguida pelo fantásma das idéias (minhas ou de outrem) que tornavam-se vapor por falta de investidores, vi na menina loira de modos delicados a possibilidade de, enfim, poder realizar algo lindo, poder realizar algo grande, poder transformar uma idéia em algo além de um quadro, por todos nós, que tanto sonhamos e que, às vezes, tão pouco pudemos.

Os filhos da burguesia hoje se redimiram, me provando em palavras suaves e olhos brilhantes de sonhos que se pode acreditar e sonhar com algo maior e melhor do que corredores patinados que fingem ser ouro.

Filhos da Burguesia





Enquanto escrevo estas primeiras palavras em uma caneta-brinde da Oxford Press tento formular a linha que seguirá este texto. Por enquanto não tenho conclusões, apenas impressões.

Escrevo sentada em um puff preto em frente ao bar do salão de festas da casa de um embaixador. Mudei de lugar, agora sento em uma poltrona preta, à minha frente uma junkbox. Ao meu lado, um piano de cauda e, como minha companhia, uma taça de espumante nacional.

O espumante é uma das coisas que me lembra que não estou na França e uma das muitas que me lembra que estou entre a burguesia e, não, entre a aristrocracia. A ostentação salta aos olhos, como lhe é propósito. Os corredores mais se parecem com os labirintos de monastérios que levam à passagens secretas. No andar central, muitos salões separados por cortinas me fazem querer arriscar um palpite:

"Foi o Senhor Mostarda, com o castiçal, na sala de jogos".

O cenário decorado à Luiz XV é o ideal para um assassinato. Corrimãos patinados em dourado em uma tentativa patética de imitar palácios de ouro denunciam: é o assassinato do bom gosto pelo dinheiro. O homicídio do ser sufocado a gritos pelo ter.

Quando comecei a escrever acontecia um desfile.  Um "estilista" de "alta costura" da província exibia seus vestidos em cabides de meninas ricas que, completas da insegurança que acompanha os 16 anos,  não desfilavam, tropeçavam em pedaços de panos esvoaçantes. Sinto uma certa nostalgia de tempos que não vivi, onde os criadores chamavam-se costureiros e as criaturas, damas.

Esse é o retrato que faço de uma burguesia já não mais mecenas da arte e, sim, da frivolidade. Pinturas de uma província.

Primeiro de Outubro de 2009.
Porto Alegre.
Reunião do Catálogo de Brotos.