segunda-feira, setembro 06, 2010

Pré-Paixões

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O início de uma paixão é sempre um momento sublime; poderia dizer, quase divino. Mas não é bem no início da paixão, um pouco antes: na pré-paixão. Aquele estágio em que alguém, de alguma forma, fez tocar os sinos e que sentimos que, ao mínimo descuido, num tempo menor que um piscar de olhos, poderíamos nos apaixonar. 

Nessa fase, tão delicada, tão ilusória, na ânsia de nos tornarmos interessáveis a quem tanto nos interessa, acabamos por nos tornar extremamente interessantes: para nós mesmos. Cabelos brilhosos; de novo a vontade por vestir todos os dias a combinação mais bonita que conseguimos encontrar no armário; a simpatia que exala e atinge até o senhor da padaria...

Para praticantes, o retorno à poesia. Para os devotos, o encontro com corpo. Para os humanos, a redescoberta de si: do melhor de si. Aquele que sorri para espalhar o sorriso, aquele que presenteia para externar a ternura que lhe explode, aquele que aceita do mundo o que esse tiver a oferecer e não se frustra caso o mundo ofereça pouco, menos, nada. A pré-paixão busca a si mesma. Enquanto a paixão embriaga-se do outro (e dele depende), a pré-paixão basta-se em si.

Uma saudação budista fala: o deus que está em mim saúda o deus que está em você. E, se este deus que está dentro de mim torna-se melhor assim, então acho que a pré-paixão é um dos estados divinos: o meu deus brilha, o meu deus sorri e, aqui de longe, tenta dizer ao teu deus: olá.

Deveríamos viver todos em constante estado de pré-paixão: emoções ainda todas sob controle, mas já os olhos com o brilho daqueles que antevêem a possibilidade do gozo. Portanto, pré-apaixonem-se. Por uma árvore, por um dia de sol, por uma voz ao telefone, pelas letras de um livro, pelas próximas férias, pelo desafio a seguir. Pré-apaixonem-se, nem que seja por si. 

(dia de ventos, praias e poetas, Setembro, 2010)

  

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