sexta-feira, março 02, 2007

Retrato de Pessoa

Lisboa é um magrinho de óculos. Não há músculos que se veja logo de cara. Lisboa não é um corpo que indique as direções. É uma cidade para ser descoberta em uma conversa tranqüila, ao sabor de Pasteis de Belém com canela, a beira do Tejo e com o bebericar de um Vinho do Porto, onde, em pequenos detalhes, acabamos por nos apaixonar.

Um lugar que não combina com pressa, onde as direções são conquistadas, não indicadas. Mas é um magrinho encantador, daquele tipo que nunca é o centro das atenções, mas que é capaz de manter uma bela mulher ao seu lado por horas só com sua fala e seu olhar.

Não por acaso Lisboa são as pessoas de Pessoa, o coração quente e o sorriso acolhedor da latinidade européia com o sotaque de impecável correção gramatical, porém tão comicamente doce que se torna completamente despretensioso, mesmo que seja falado por um Camões de roupas pomposas ou com a ranzinzisse tipicamente lusitana de um dos tão humanos personagens de Queiroz.

As ruelas apertadas em sobes e descem, com um odor de urina já instaurado e já parte da paisagem, de tão portuguesas deixam de ser inóspitas de se caminhar por, mesmo depois de já se doerem as nádegas de tanto subir. Mas tal magrinho conhece também bem o emprego de palavras eruditas e nem tudo é miudezas. Uma arquitetura riquíssima marcada pelo original manuelismo e a herança de monarquias se mistura com a tentativa clara do país de modernizar-se, ser pólo de cultura e nivelar-se ao resto do que hoje forma a, esta sim bastante esnobe, dama que é a União Européia.

Portanto, não é falácia que se diga, por exemplo, que Lisboa é um poeta e heterônimos. Uma personalidade, e muitas. Na delicadeza e acolhimento sem perder o brilho e genialidade que formam esta, hoje moderna, cidade secular. Correndo o risco de ser piegas ao parafrasear clichês, ouso dizer que, ao sentar-se sobre os tijolos das ruínas do Castelo de São Jorge, no topo de uma das 7 colinas lisboetas e observar o Tejo encontrar o mar e o velho encontrar o novo, qualquer um diria que a não pequena alma de Lisboa faz tudo valer a pena.

Bibiana Xausa Bosak – Lisboa 05.05.06

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