domingo, fevereiro 06, 2011

Milano #2: Il Primo Corso in Italia

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Estou feliz, sem mais.

1 cálice de vinho rosso (meio ruim), mais pão caseiro com olio di oliva na esquina do hotel. Como não estar feliz?

No voo tinha filmes pra escolher, assisti novamente "Comer, Rezar e Amar". Uma escolha um pouco óbvia e um tanto popular, mas achei que cabia bem ao momento e agora, totalmente encantada com a toalha xadrez da pizzaria, me sinto a própria Elisabeth Gilbert a descobrir (-se).

Essas páginas vão acabar virando registros dos textos que eu ia escrever. Eu ia escrever um texto sobre auto-profecias e sobre como coisas que eu havia desejado para mim se realizaram ao longo do tempo. A última das profecias era a realização desta vinda, mas, agora que estou aqui minhas profecias  parecem - não vou dizer erradas - mas muito menos encantadoras do que suas realizações.

O panini está delicioso, tudo está delicioso. O pequeno hotel em que estou hospedada é de uma família asiática. É muito pequeno e bastante simples, mas me encanta igual. Há um pequeno pátio onde estou louca para tomar café da manhã.


A cidade é reta, com traços bastante angulosos - ângulos que condizem com o que se espera dos traços no norte da Itália. Todos até agora foram muito gentis comigo (ou eu fui muito gentil com todos). Meu italiano não vai bem, mas as línguas são bastante similares, acho que não vai ser difícil. 


          



Fico repetindo mentalmente as palavras que escrevo e penso que em um mês tempo elas me parecerão datadas e banais, pra não dizer óbvias (até porque óbvias já são). Mas, do futuro, olho para estas palavras com carinho, porque este deslumbramento, esta ingenuidade no olhar, eu sei, valem mais do que sei.
Oxalá não se vá com o tempo esta capacidade de encantar-se-me. Oxalá o olhar jamais torne-se reto como os traços. 

Milano, 19.01.201011
(insisto em não conseguir escrever
em que ano estamos, estou. 
Será que estou?)

Observações: 

Teimo em recorrer ao espanhol ao tentar falar italiano. Ontem, olhando para o caminhão dos bombeiros, me ocorreu um truque:
Vou continuar recorrendo ao espanhol, mas sempre onde houver UE, como em fuego, vou trocar por UO, como no fuogo do caminhão de bombeiros. Acho que vai funcionar. 

Alguns descobrimentos: 

Com a minha câmera nova na mão e pensando sobre o Gaspar, concluí: não há como ser viajante e não tornar-se automaticamente manualmente fotógrafo. O prazer estético que permitem estas fantásticas máquinas de parar o tempo + a eternização das descobertas + a companhia que este diálogo com a imagem representa tornam impossível não apaixonar-se. 

Conclusão #2: 

Quando em solidão, a câmera, a caneta e o caderno tornam-se nossos (meus) melhores amigos. Melhor: não há solidão quando na compahia da câmera, da caneta e do caderno.

Palavras e Imagens #1: a capacidade simbólica que tira o ser da sua condição animal e transporta-o para sua condição humana - artista.

Palavras e Imagens #2: a capacidade simbólica e tradutória que tira o homem da sua condição de isolamento e trasporta-o para sua condição de pertencimento - ao meio e "ao si": ser.

(prime ore del mattino - 20.01.2011)

P.S. Essa experiência de aprender uma nova língua in loco é indescritivelmente prazeirosa. Claro, já se tendo alguma base, ao contrário imagino que um ficaria tonto e em profunda solidão. Mas, entendendo um pouco, o processo de reconhecimento e aprendizado dos fonemas, a repetição das construções frasais, os descobrimentos das conjugações - cada sílaba transforma-se em um infinito parque de diversões cuja (o que é o melhor de tudo) a insaciabilidade e o desejo por mais vem sem culpa nenhuma.  

Fora o fato de que gera em mim felicidade e alegria extremas reconhecer no olhar dos que falam comigo o prazer de ver alguém esforçando-se para aprender. Para a maioria - os de bom coração, suponho - este esforço que faço parece gerar um sentimento instantâneo de empatia e carinho, que vem logo seguidos pela pronúncia pausada de orações perfeitas e completas e a espera ansiosa e atenta pela minha repetição de cada encontro de fonemas.

Notei: que transformou-se comigo muito, até a forma da minha escrita. Percebi que minhas observações permanecem igualmente doces e ternas - coisas que já muito confundi com inocência e infantilidade - porém a forma de expressão mudou. Minhas palavras parecem querer tornarem-se mais exatas, mais reverentes, mais profundas. 

É Milano, parece que teus ângulos retos ainda hão de provocar em mim r(evoluções) continentais...


Bibiana Xausa Bosak
Milano, Lombardia
20.01.2011

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